E então, quando me entendi por gente, comecei a ter gosto musical. Eu tinha um balanço em casa, que me lembro até hoje. Mas não era desses balanços prontos e de plástico que vende por aí não. Nem existia essas coisas naquela época. O meu balanço era mesmo feito com corda e uma tábua de madeira, que meu pai fez pra mim. E eu posso dizer bem que acho que foi a primeira paixão da minha vida aquele balanço. Gostava muito mesmo. E então enquanto a minha mãe lavava a louça, eu sentava lá e balançava. Entrei na escola bem cedo, porque ela tinha que trabalhar e eu não tinha com quem ficar. E a parte que eu mais gostava da escolinha era a música. De atirei o pau no gato a borboletinha fazendo chocolate para a madrinha com uma passada rápida por marcha soldado, pobre de marré, passa anel (tinha uma música pra passar o anel!) e fui morar na casinha enfeitada de cupim. E aí soma-se mais trocentas musiquinhas tradicionais que eu aprendia cada uma e chegava em casa fazendo show para os meus pais. Lembro bem que meu pai tirava uma com a minha cara (porque ele tinha só uns 25 anos) e deve ter sido daí que eu aprendi a ser tímida. Enfim. Eu gostava das musiquinhas, aprendia e depois cantava em casa sozinha. Sentava no meu lindo balanço e cantava cada uma. Tinha até uma ordem pra cantar. Depois o repertório foi aumentando e eu passei a acrescentar trechos das músicas que meus pais ouviam, no rádio mesmo. Eu cantava numa boa com a Rita Lee que no escurinho do cinema chupava 'dropchonis' e outras versões à lá Renata do tipo. E mais as que a gente usava na escola pra fazer apresentações, tipo aquela da pulga e do percevejo que fizeram a combinação.
Daí que o primeiro disco que eu ganhei na vida (é, eu sou de 1979, minha nega!) foi no aniversário de 6 anos. Trem da Alegria. Achava lindo brincar com o meu triciclo (é, porque eu não tive tico-tico. Eu tive um belo de um senhor triciclo, igualzinho àquele do Quico, do Chaves!) pelo quintal cantando as músicas. Cantava Unidunitê do Trem da Alegria como ninguém. E nesse disco tinha aquela música que chamava Hi Lili Hi Lo, e que depois que representamos na escola e eu fui com aquela fantasia tchutchuca de flor, com a cartolina cortada em volta da cabeça... passei a saber cantar. E cantava Dona Felicidade também, porque eu achava a Lucinha Lins fofa e daí gostava da música. E então que depois eu ganhei um disco do Balão Mágico, que vinha com um carrossel pra montar. E daí aprendi a cantar que o Barato Bom é da Barata. Mas eu assistia Atchim e Espirro na tv e por isso mesmo foi o disco que mais gostei de ganhar e sabia cantar todas as músicas. E a Dança do King Kong tinha até coreografia!
Mas aí eu fui crescendo, e apesar das constantes investidas do meu pai pra que eu ouvisse rock (hoje ele conseguiu!) e minha mãe me fazendo decorar por osmose as músicas do Elton John.. eu continuava firme e forte no meu Atchim e Espirro. Até começar a assistir a Angélica. Daí pronto, que naquela época depois que a menina fazia 10 anos (hoje é beeem antes disso) o papo já começava a ser sobre os meninos. Ah, mal sabia eu que tava entrando no papo que ia me acompanhar para o resto da vida nas rodinhas de meninas. Tá. Daí que todo mundo gostava de alguém menos eu. Eu tava era feliz da vida que tinha ganhado logo ali, aos 9 anos, minha primeira Barbie! Nem morta que eu trocava ela por algum menino daqueles que babavam. Todos babavam, claro. Mas um dia a insistência venceu e eu olhei assim em volta e foquei. Fernando, meu filho. Vai ser você. E pronto. E aí eu já precisava gostar de músicas que falavam de amores não correspondidos...... porque afinal de contas o menino nem sabia o que era amor e muito menos que eu tava sentindo por ele, claro. Mas foi um fato marcante para que o meu gosto musical mudasse. E a Angélica tinha boas músicas de amor platônico pra me acompanhar.
Daí que, não muito tempo depois disso... eu tinha uns 12 anos quando comecei a ter meus primeiros assuntos elaborados com as pessoas. Passava longas tardes com meu tio conversando sobre filmes que gostávamos. Sobre música. Sobre grandes programas. Sobre comerciais de tv. E aí que na época existiam muitos comerciais de cigarros. E era sempre uma coisa que chamava a minha atenção, porque eu não conseguia entender muito qual era o fundamento do negócio - afinal de contas o cigarro mal aparecia - mas achava bonito. Lembro que eram sempre mais elaboradas do que as propagandas comuns. Mas eu era fã mesmo das propagandas dos cigarros Hollywood (videozinho supimpa - e tremendamente velho - aqui). Se eu fumasse, ia ser Hollywood. Porque os comerciais eram sempre bonitos, com alguém surfando em uma onda enorme e com uma bela música de fundo que combinava com tudo. Todo mundo feliz e sorrindo. Eu achava o máximo. Bonito mesmo. E então que, numa das grandes conversas com meu tio (eu com 13, ele com 10 anos) um dia ele falou: 'parece que o cara que canta algumas daquelas músicas chama Bon Jovi.'
É. Nessa altura do campeonato você, meu filho, que me acompanha, me lê no twitter, frequenta meus blogs há algum tempo... já sabe que foi essa a frase divisora de águas na minha vida. Eu comecei mesmo a ficar fã de comerciais de cigarros. E nunca nem dei uma tragada na minha vida. E daí que, coincidentemente.. comecei a descobrir que minhas amigas na escola eram fãs de Bon Jovi. Falavam disso, colecionavam revistas. Eu sempre achei essa coisa de colecionar fotos de artistas a maior pobreza. E caro ao mesmo tempo. Jura que você vai comprar a revista toda por causa de uma página? Ah não, pelamor. Pra mim não dava não. Eu ficava feliz de ouvir as músicas no rádio. E então que em 1993 o Bon Jovi veio fazer um show no Brasil. Eu tinha exatos 13 anos e pensei que era melhor nem sonhar uma coisa dessas. Porque a minha mãe não me deixava nem ir na casa das amigas brincar, imagina num show em um estádio. Nem me arrisquei a pedir com medo de morrer. Ou devo ter pedido e a resposta deve ter sido tão traumática que esqueci. Não sei. Mas guardei a propaganda do jornal... deve estar em algum lugar bem fundo por aí. Bem junto com a minha amargura por não ter ido. Mas as amigas da minha sala foram. E voltaram todas felizes e contando sobre no dia seguinte. Ódio. Mas não tem problema não. Quando eu fizer 18 anos irei.
Anos se passaram e chegou no mundo a era do CD. Maior bonito os disquinhos. Meu pai foi lá, comprou um cd player... e um cd pra experimentar. Adivinha de quem. Coletâneas do Bon Jovi. O engraçado é que meu pai nunca soube bem quem é Bon Jovi. Negócio dele é uma coisa mais Guns, mais Led Zeppelin, mais Queen, mais Pink Floyd, mais Black Sabbath. Mas na compra do cd, não sei o que foi. Não sei se achou a capa bonita. Não sei se ouviu falar do nome da banda e achou bonito. Não sei. Sei que ele comprou. E foi do Bon Jovi o primeiro cd que eu ouvi na vida. Alguns meses depois meu pai comprou outros cds. E eu, um belo dia.... roubei o cd do Bon Jovi. Que ele gostava tanto e dava tanta falta que nunca percebeu. Tá aqui nas minhas coisas até hoje. Um tempo depois me perguntaram o que eu queria de presente de aniversário.. e eu pedi um cd player. Demorou mais de 20 anos pra eu ter uma tv no quarto. Mas o aparelho de cd era fundamental. E daí eu já podia ouvir o cd do Bon Jovi muitas e muitas vezes e cantar junto com o encarte, lindo assim.
Foi Bon Jovi que eu ouvi enquanto acompanhava meus amores platônicos. Foi Bon Jovi que eu ouvi minutos antes de dar o primeiro beijo e quando cheguei em casa, dancei uma música do Bon Jovi pra comemorar. Foi um cd do Bon Jovi a primeira coisa que eu comprei com o meu dinheiro. Era Bon Jovi que eu ouvia quando estava feliz. Era Bon Jovi que eu ouvia quando estava muito triste. Foi Bon Jovi que eu ouvi minutos antes da primeira transa e, quando cheguei em casa, dancei Bon Jovi pra comemorar. No meu walkman (eu sei que eu sou velha pacas, não precisa ficar lembrando) tinha uma fita (tutancamon!) do Bon Jovi. E por mais que os anos tenham se passado, que eu também tenha ficado muito integrada com o mundo 'dance' que nascia e nos entremeios daquela onda do além de lambada... eu estava sempre comprando mais um cd do Bon Jovi pra completar a minha coleção.
Daí que a gente começa a namorar e pega os gostos musicais dos namorados. O primeiro cd que eu pedi no 'amigo secreto de cd' foi Tony Braxton (???) e eu só sei que perdi mais uma bela oportunidade de ter outro cd do Bon Jovi. E aí um belo dia eu resolvi namorar com um cara que tocava violão e que, pra me agradar.... cantava músicas do Bon Jovi. E eu tenho mesmo que contar pra vocês que eu sinto O MAIOR ALÍVIO por não ter mais que olhar pra cara dele e dizer mal e falsamente 'que lindo, amor, adorei!' e antes que ele, todo empolgado, passasse para outra música do Bon Jovi eu dizia desesperadamente 'agora então toca aquela do Raimundos que eu gosto mais'. E então eu tive que deixar de lado um pouco o meu Bon Jovi, porque se eu quisesse escutar no carro, ele resolvia cantar junto. E gente, cá entre nós. Eu gosto de ouvir o Bon Jovi cantar, entendeu? Não qualquer outro mané cantando por cima do meu Bon Jovi lindo e maravilhoso. Isso me deixava tremendamente pê da vida, muito-muito-muito mesmo! Caramba que pô..... quer cantar, meu filho.. que cante qualquer outra coisa aí do seu mundinho e não o MEU Bon Jovi, porra!
Parei. Parei de ouvir Bon Jovi e passei a ouvir Skank. Igualzinho, fala a verdade. E aí comecei a gostar de rock musical, que pelo menos enquanto ele cantava não me incomodava. Mas felizmente tudo que irrita acaba e o namoro acabou e junto com o término aflorou em mim, de vez, minha veia rock 'n roll. Oi, pai, cheguei. Hoje eu ouço tudo aquilo que você quis tanto que eu ouvisse. Canto Janis Joplin a plenos pulmões. Não satisfeita, incorporei o Metallica na veia. Mas eu não tenho medo de dizer que é no rock menininha que eu sou mais feliz. É no Foo Fighters. É no Aerosmith, que dividia espaços no meu walkman também. E é no Bon Jovi. É do Bon Jovi a minha única coleção de cds, completíssima. Originais, com selinhos e tudo. É do Bon Jovi o wallpaper do meu computador, desde que eu tenho um computador. É do Bon Jovi a primeira camiseta preta que eu comprei na vida, e tenho ela até hoje. Foi pra usar argolas douradas como o Bon Jovi usava que eu fiz mais um furo em cada orelha. Foi do Bon Jovi o primeiro cd que ouvi no som do meu carro, e sempre tenho lá um cd com as melhores músicas dele, até hoje. São do Bon Jovi os cds que eu sempre quero desesperadamente comprar no primeiro dia de lançamento. E, apesar de não ser mais com tanta frequência.... é Bon Jovi que eu escuto há quase 20 anos sem enjoar. Foi o último cd do Bon Jovi o que eu pedi quando fiz 30 anos e me perguntaram o que eu queria ganhar. Junto com esse, comprei o primeiro, raro, remasterizado. E assim, no meu aniversário de 30 anos de vida, completei minha coleção.
Devo dizer que eu acho sim que Bon Jovi é coisa de mulherzinha. Que homem que olha pra mim e diz 'eu gosto de Bon Jovi' é meio suspeito. Pra mim homem que é homem pode até gostar, mas não pode admitir. E acho também que o gosto musical muda conforme vão passando os anos. A gente evolui, começa a gostar de coisas melhores, vai deixando de lado os gostos infantis e aprimorando a coisa. Eu aprimorei o meu gosto musical sim. Incorporei muita coisa e posso bem dizer que sou bastante eclética. Gosto de quase todos os ritmos musicais e eu juro que sei cantar até Brincar de Ser Feliz, de Chitãozinho e Xororó. Sertanejo, o gosto musical que beira à loucura, na minha opinião. Mas gosto é gosto, fazer o que? Mas apesar de ter virado toda a roqueira que papai sempre quis, ter acompanhado de perto a transformação de poperô (que o Fernando gostava - lembra do Fernando? Lá do terceiro parágrafo?) em música eletrônica, ser a namorada que canta todos os rocks nacionais que o ex sempre quis, e entender da mpb que deve ter brotado em mim porque apesar de meus pais sempre ouvirem o Chico, ninguém nunca quis que eu gostasse... eu não esqueci do Bon Jovi. Não esqueci que foi ele que me acompanhou em tantos anos de vida. Em tantas indas e vindas. Em tantos choros e alegrias. Tantos começos e finais. Foi com o Bon Jovi o sonho que eu sonhei há muitos anos e nunca mais esqueci. E apesar de não cantar mais suas músicas acompanhando o encarte desesperadamente... ainda é a minha banda favorita.
É, porque tem gente que pode gostar imensamente de Bruno e Marrone e chorar de cantinho quando ouve no quarto sozinho... e sai lá na rua dizendo que ama o dj sei lá das quantas. É porque amar o dj dá ibope, e o Bruno e Marrone nem tanto. Tem gente que molda seu gosto pelos gostos alheios. Fala que gosta mais do que é mais bonito de dizer. Gente que veste máscara. E eu não sou assim não. Eu sou aberta sim a novas experiências, mas nada passa por cima das minhas origens, das minhas raízes. E eu posso gostar de muitas outras coisas, mas nunca substituirei por meus próprios gostos. E não tenho vergonha de dizer não. Eu gosto de Bon Jovi e se você acha que isso é o maior mico, problema seu. Se você acha brega, problema seu. Amigos estão aí à sua disposição. Os que dizem coisas que te agradam e gostam das mesmas coisas que você porque é mais conveniente, inclusive. Boa sorte. Como se gosto, que é uma coisa tão pessoal, influenciasse diretamente na simpatia que você sente por alguém. Rá.
Enfim, desde os meus 13 anos para cá... o Bon Jovi veio fazer um show em São Paulo. Fechado para o público. Somente para convidados. E eu fiquei tentando, durante vários dias, ligar para a rádio e participar de promoções para ganhar ingresso, sem sucesso. Mas não os julgo por isso não, porque daquela vez que o show foi aberto, eu tive vergonha alheia. Vergonha alheia de ver o Bon Jovi no Faustão, que não sabe falar inglês. Vergonha alheia do Bon Jovi no Programa Livre, que a meninada agarrava chorando e passando baba e meleca de nariz na roupa limpinha dele. Não julgo não, sabe? Eu acho mesmo que se ele pensa que aqui é mesmo um país melequento e subdesenvolvido.... tem toda razão. Porque é mesmo. Esse povo gritando, chorando, melando, suando, babando... é mesmo um horror, eu concordo. E concordo mesmo que ele tenha motivo pra estar vindo aqui fazer um show aberto somente depois de 16 anos. Tá vindo só porque todo mundo também está, eu sei. Tá vindo só porque devem ter espalhado lá no hemisfério norte que o Brasil está rumo ao desenvolvimento. Está mesmo. Rumo a. Por enquanto, continua tudo a mesma coisa. Gente chorando, babando, melando. E eu vou mesmo levantar uma plaquinha lá no show dizendo "eu não pertenço a essa gente". Em inglês muito bem escrito, claro.
E então que eu escrevi esse livro pra dizer que hoje é um dia especial. Porque hoje, aos exatos 30 anos e 6 meses de vida, e depois de tanta espera.. eu comprei o ingresso para o show do Bon Jovi. E digo pra vocês que eu paguei, sem dó nem piedade, 720 reais. E eu quero que foda-se quem vier me dizer que é muito dinheiro, que é um absurdo, que é dinheiro jogado fora, que eu podia ter doado para a caridade. Foda-se. Foda-se, porque o dinheiro é meu e eu faço dele o que quiser. Foda-se quem acha o que quer que seja porque sou eu que pago minhas contas e não devo satisfações pra ninguém. Porque, atipicamente, hoje eu gastei dinheiro. E, atipicamente, gastei dinheiro comigo. E, quando me traz felicidade, não importa quanto foi. E não interessa pra você se, pra ser feliz, às vezes, eu precise pagar. Dinheiro pra mim traz felicidade sim.
Hoje a minha felicidade custou 720 reais.
E eu tou feliz pra-ca-ra-le-o.
Eu casava fácil com esse biquinho. Juro!