segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Lidia

(não é você não, engenheira. Seu dia de estrela ainda não chegou. Aguenta ae que no dia que chegar eu faço maionese pra gente comemorar.)


Sou uma pessoa que não chora em filmes. Na verdade eu choro muito pouco nessa vida, e nas poucas vezes que isso acontece quase sempre eu estou chorando de raiva. É mesmo bem raro alguém me ver chorando. Porque eu sou forte. Quase tanto quanto Lidia.


Lidia é uma mulher que um belo dia conheceu aquele que viria a ser seu grande amor. Ela, corpo magro e sedutor, deixou-se envolver pelos encantos dele, um negão de presença. Ele, casado, muito bem de vida, carro de luxo e conta bancária gorda, aproveitou-a até que ela engravidasse e tivesse seu corpo modificado por isso. Ela teve a filha dele e voltou a ter o corpo como o de antes. E então ele se apaixonou por ela novamente, mas ela, magoada, já não tinha por ele a mesma afeição de antes. Ele então gostou de ser pai e quis ter outro filho com ela, dessa vez um homem. Ela, ajudada por outra mulher, ligou as trompas e escondeu o fato do amante. Por anos seguidos ela afirmava que sim, fariam o filho homem que ele tanto queria. Ele, cheio da grana, pagou por anos a fio o tratamento dela para engravidar. Ela, pobre, trompas ligadas e coração cheio de mágoa, usou todo o dinheiro dele pra construir uma casa pra ela e para os filhos. E outra casa pra alugar. E outra casa. Ele, negão cheiroso, a usava estritamente para o sexo. Ela, apaixonada, tinha desejo por ele mas não conseguia mais se deitar. Comprou uma arma um belo dia. E decidiu matá-lo. Em uma carona no carro de luxo dele, ela apertou o gatilho. Uma, duas, três vezes. E a bala não saiu. E ela, no primeiro ato de dignidade que teve na vida, saiu do carro e voltou pra casa andando. Do dinheiro dele ela cresceu na vida. Fez cursos, mudou sua situação financeira. Ele morreu há alguns anos e deixou a certeza de nunca ter amado Lidia. Ela, olhando fixamente para a câmera, disse ter passado por tudo por ser forte. "Tenho tanto jogo de cintura que meu cabelo é duro e pixaim, mas quando eu balanço a cabeça ele balança junto." Lidia, que cantou em cena a música que a faz lembrar dele. A que tocava no toca fitas do carro de luxo, toda vez que ela ligava. E se imaginava nos filmes de Hollywood, feito Marilyn Monroe sentada em um carro conversível e com a echarpe sendo levada pelo vento. Lidia nunca andou em um carro conversível, mas tem várias echarpes. Lidia, uma mulher guerreira.

Que saiu de cena e chorou de soluçar por trás das cortinas.


E eu estou aqui até hoje desesperada querendo dar um abraço nela. Por toda essa sociedade que nos obriga a ser fortes quando tudo o que a gente quer é chorar. Por muitas vezes termos que levantar da cama todos os dias e responder a todos os bom dias e dizer que sim, está tudo ótimo. Quando a gente só quer morrer. Por ter milhares de pessoas todos os dias no Facebook fazendo competição de quem é mais feliz pra exaltar, na maioria das vezes, exatamente o contrário do que se passa por dentro deles. Obrigação de estar bem. Tristeza é guardar no coração, trancada a sete chaves, uma mágoa que não se pode expressar. Não se pode conversar a respeito, não se pode nem chorar. Porque isso é sinal de fraqueza. "Nossa, mas há tempos você já devia ter superado isso". Quem disse? Quem disse que tem tempo pra superar fatos? Quem foi que disse que os três dias que a lei trabalhista dá para luto por morte de familiar são suficientes pra chorar e se recuperar do ocorrido? Quem foi que inventou esse negócio de passar corretivo no rosto pra esconder as olheiras de uma noite mal dormida? Quem foi que disse que a gente tem obrigação de ser feliz?

Chorei junto com Lidia.


Filme "As Canções", de Eduardo Coutinho, foca o cancioneiro brasileiro e 18 personagens. Traz depoimentos que explicam escolhas de músicas como trilhas de suas vidas. (...) O melhor está na história que cada um conta pra explicar porque aquela determinada canção é a trilha da sua vida. (...) Não há grandes peripécias a contar nestas vidas, todas muito comuns e parecidas com a da platéia que as verá. (fonte)



E, fazendo da voz do Queimado as minhas: "quem não gosta de música não tem lembranças."


Mas gente. E o RAMON então? Tô chorando até agora.

5 comentários:

  1. Sim, sou sensível e choro no cinema. E só Jesus pode me julgar.

    ps: É a Carol. Tô tímida, like a canceriana,néam. Olha isso: http://fanciulla-gentil.blogspot.com

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  2. Chorar faz parte do ritmo da música... o post não foi para Lídia Engenheira mas ela com certeza se sentiu homenageada, simplesmente por existir essa outra Lídia...

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  3. caramba q história... realmente, tem umas coisas q nos são impostas e a gente aceita pq alguém disse q assim q funciona...
    tá tudo errado
    =)

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  4. Agora entendi o que tu disse no twitter, Rê, e concordo com cada palavra. Tem dias que a gente só quer ter um pouco de colo, ou ser deixado quieto mesmo. Não é considerado normal estar triste, e talvez seja por isso que às vezes guardamos tanta coisa dentro de nós que, uma hora, precisarão sair. Morro de medo de quando essa hora chegar pra mim.

    É por isso que eu sigo a filosofia de que chorar não é um ato de fraqueza, muito pelo contrário. Sou dessas que de vez em quando chega chorando na escola, pede pra ir ao banheiro enquanto a professora pergunta "O que foi?" e fica lá, por um tempão, pensando na vida e se acalmando. E o que os outros pensarem ao me ver com a cara vermelha é problema deles.

    Beijão!

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  5. Clap clap clap clap clap --> Muitas palmas, que lindo post!

    E eu AMO o Queimado. Me afeiçoei a todo mundo ali, na verdade. Passaria dias e dias ouvindo histórias das pessoas por aí. Vou sair por aí perguntando quais são as trilhas da vida do pessoal.

    E a Lidia, cara. A Lidia é amor demais. Alguém abrace ela, por favor. Queria abraçá-la também. Tantas, tantas vezes me fiz de Lidia por aí. E TÁ ERRADO.

    Bóra sair de trás das cortinas, todas nós?

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