ou Sobre o dia mais legal da minha vida - relato completo - Parte 2 de 564
Assim que cheguei (antes das 6 horas da manhã) me enturmei com as pessoas. As da frente e as de trás, fizemos todos uma grande família que compartilhou vários momentos do dia juntos. Luana, Mônica, Gabriela e sua mãe, Milena, Nicole e sua amiga. E mais os dois casais atrás de mim. Gabriela, uma mocinha de apenas 15 anos falava de Fresno franzindo o nariz e explicava que gostava de Bon Jovi por causa de sua mãe, que sempre gostou. E que apesar da mãe estar ali na fila o dia todo com ela e a amiga e ser muito fã, não iria ao show. O dinheiro não deu pra comprar ingresso para as duas. Nicole e sua amiga, também de 15 anos, também foram acompanhadas pelos pais que as olhavam do outro lado da rua, sentados em bancos dobráveis e à sombra de uma árvore. Rá que meus pais nunca que fariam uma coisa dessas. Luana levou comida a mais pra repartir com quem estivesse perto e Mônica emprestou o guardachuva pra ela e pra mim quando viu que estávamos as duas ficando de branco palmito a vermelho pimentão por causa do alalaô que o sol estava quente e queimou a nossa cara. Os dois casais atrás de mim fiscalizavam com rigor quem entrava e saía da fila e entre os muitos pontos satisfatórios do dia, o excepcional: organização. Mulher é fogo mesmo e em uma fila onde somos a maioria ninguém dá ponto sem nó. Decidiu-se ali mesmo que essa coisa de chegar cedo e guardar lugar pra cinqüenta neguinhos que chegam só na hora do show não ia rolar. E a partir daí passamos a barrar os desinformados furadores de fila da casa da mãe Joana toda. Para identificar as saídas inevitáveis de ‘vou no banheiro e já venho’ (nunca tive que anunciar pra tanta gente que eu tava indo no banheiro) passamos a apelidar as pessoas. A Luciana Melo. O Slash depois da aids, o indivíduo andrógeno não identificado. A turma do Superman. A japa emo com cabelo de capacete que foi ver o Fresno e chorou quando a gente não deixou ela furar a fila. A menina do olho azul. A gangue da camiseta amarela. E a barraca 2, cuja lenda era a de que estava lá desde a quinta feira anterior, 6 dias portanto, com 15 pessoas que precisavam se revezar pra tomar banho. Eu nem perguntei quantas pessoas estavam na barraca 1 e há quantos dias estavam lá pra evitar a fadiga. E porque eles eram chatos mesmo. Enfim, apoiados pelos muitos orientadores oficiais posicionados ao redor de todo o estádio, nós mandamos e desmandamos na fila. Quem entrava, quem saía, a hora que entrava e a hora que saía e onde ia. Eu, claro, no meio da galera. Porque nasci para liderar, me disseram uma vez. Eu chamo isso de ‘me diverti horrores enquanto não tinha nada pra fazer’.
Fato foi que eu comprei uma revista e uma palavra cruzada no dia anterior, pensando em me ocupar durante o dia. E foram duas coisas que eu nem tirei da mochila e que do jeito que estavam foram para o lixo. Eu tentei sim, tirar um pouco pra ler, afinal tava tudo novinho, maior dó de jogar fora. Não é permitido entrar com revistas no show, eu já sabia disso. Sei lá, deve matar se você jogar. E aham que ô que eu ia no melhor show da minha vida ler revista! Só esperava ter lido antes de jogar tudo fora. Enfim. O que eram 10 reais né? A ansiedade era muita e eu não conseguia me concentrar em nada que não fosse olhar e falar sobre tudo o que acontecia ao meu redor. “Falar mal das pessoas faz o tempo passar mais rápido” me disse a Luana. Concordei. Agitada, presenciei feliz cada figurino bizarro, cada entrevista para a tv, cada briga, cada vendedor de qualquer bugiganga possível, cada ambulante correndo da fiscalização, cada choro de gente que chegava depois sem poder furar a fila. E o resto do mundo indo trabalhar, passando engravatados em seus carros nem tão apressados assim – porque tinha muita gente, teve trânsito - em frente ao estádio e xingando que a gente era peão. Aham. Pagando 720 reais num ingresso e podendo faltar no trabalho bem no meio da semana. Quem é peão aqui?? Analisei a cada minuto o quanto a fila crescia e crescia e o quanto eu estava perto da entrada. E participei das mais variadas discussões sobre tudo o que pode surgir em uma fila de show. Sobre o tempo, ‘Patrícia Poeta falou que não vai chover!’ (e não choveu mesmo!), sobre as combinações de irmos ao banheiro, sobre as músicas preferidas, sobre “você já pegou metrô na Sé 18h? Então está preparada pra ficar na grade em um show”, sobre de onde éramos e o motivo por estarmos sozinhas, sobre os shows passados, sobre o calor, sobre ninguém estar com a camiseta do Fresno, sobre nossa atitude durante o show deles, sobre as conversas nas comunidades do Orkut.
“Família Bon Jovi”, li esses dias em uma reportagem. Particularmente eu acho que essa nova expressão de ‘família’ é meio emo-atual-brega, sabe? Combina muito mais com Fresno que comigo. Mas ponderando sobre o meu dia tão cheio de situações novas, tudo o que eu tenho a dizer é que sim. Nós fomos mesmo uma família. Preocupados uns com os outros, fizemos um belo revezamento de banheiro. Eu me lembrava de ter banheiros químicos espalhados no entorno do estádio nos outros shows que fui, mas não foi o caso dessa vez. E também não tem nenhum estabelecimento comercial perto e os postos de gasolina fecham o acesso a seus banheiros em dia de show. Felizmente, os moradores abrem os banheiros e estacionamentos de suas casas. Também, cobrando 2 reais cada ida ao banheiro e 150 reais pra deixar o carro durante o show, eu também faria o mesmo se morasse por lá. Enfim, fui num banheiro bem bacana da primeira vez e quase esqueci de tirar o ingresso que estava na calcinha. Sorte que eu tinha colocado dentro de um saco plástico, para o caso de chover, e então fez barulho quando tirei a calça. Deu tudo certo, voltamos e dimensionamos nossa ingestão de líquido. Conforme o dia passava, ficava ainda mais difícil podermos sair e voltar de nossos lugares na fila. O portão abriria 4 horas da tarde para entrarmos, então programamos nossa próxima ida ao banheiro por volta das 2 horas. Sabíamos que depois que entrássemos no estádio teríamos que aguentar até o fim do show para ir ao banheiro de novo. Ninguém quer perder o valioso espaço de seus dois pés na muvuca do aperto de uma pista premium na grade de um show. Outro banheiro dessa vez, mas chegou lá e a bagaça não tinha porta. Então me lembrei de experiências anteriores de vida cujas quais me deram uma grande certeza: eu simplesmente não consigo usar um banheiro sem porta. Não consigo. É mais forte que eu, sabe? Não dá. Eu até tento, mas não vai. E então eu saí daquele banheiro do mesmo jeito que entrei. Teria que me contentar em ter ido ao banheiro só uma vez naquele dia. Em contrapartida, fiquei pensando na vida dura dos meus 30 anos. Sempre fui uma pessoa forte, mas ultimamente até na acupuntura tou desmaiando. Não sei, deve ser a idade, velhice, rugas... e aí o organismo resolve que agora eu vou ser maria mole assim e sair desmaiando por aí. Mas eu não ia me perdoar NUNCA se passasse mal naquele dia. Renata, minha nega, nesse sol escaldante, é preciso beber líquido mas não é possível ir ao banheiro. Não tá podendo comer glúten porque se apoderou de uma doença de véio mas também não pode deixar de comer senão na multidão vai ficar calor e aí vai baixar a pressão e aí puf. Conclusão: a pessoa fez faculdade de administração. Essa faculdade tinha que ter me servido pra alguma coisa. E serviu. Dimensionei tudo, não morri, não passei mal, não tive vontade de ir no banheiro, não fiquei com sede, não tive enxaqueca. Não tinha como aquele dia não ser mais que perfeito assim.
Devo dizer que um dos pontos mais fofos do dia foi a ligação das amigas. Porque eu fui mesmo sozinha e já sabia disso, afinal com meu gosto peculiar e o preço do ingresso, não havia outra hipótese. Mas foi muito feliz descobrir que as pessoas se preocupam comigo. De tempos em tempos alguém ligava. “Oi, chegou, já se enturmou?” foi a frase que eu mais ouvi no telefone. Tudo bem que pra bom entendedor, traduzindo fica ‘oi pessoa chata e antisocial, já fez amizade pra guardarem seu lugar na fila quando você for no banheiro?’, mas pra mim demonstrou carinho e preocupação da mesma forma e eu fiquei feliz por isso. Me enturmei sim. Porque eu sou uma pessoa muito simpática QUANDO EU QUERO. Que fique claro.
Tem um povo mega folgado nas filas que fica guardando lugar pra meio mundo né? Ainda bem que vcs botaram ordem na casa! Rs! E ainda bem que todas suas doencinhas de idosa (eu tenho um montão delas tb) não te atormentaram justamente neste dia né! E ah...vc errou o nome da moça do tempo! Não é a Patricia Poeta, é a Rosana Jatobá!!! kkkkk!
ResponderExcluirBeijos
Ei Re!
ResponderExcluirQue bom que fez altas amizades na fila, hahaha.
E que seus amigos demonstraram tanto carinho
*_*
Beijos
Já dizia minha mãe "a necessidade faz a simpatia" kkkkk
ResponderExcluirGuria, eu pagava pra ver você colocando ordem na fila!!!
Beijos
Olha, não tenho estrutura psicológica pra essa coisa de banheiro. Eu posso passar um dia inteiro sem ir, só de preguiça ou leseira mesmo, mas é só me falar que a partir de tal momento eu não vou poder ir mais que pronto, sou sabotada por mim mesma.
ResponderExcluirMas eu passei a espera do show do Switchfoot inteira ensaiando uma ida ao banheiro e quando eu resolvi sair, as luzes se apagaram. Lógico que eu voltei correndo e não lembrei de xixi nenhum. Tem dia que tudo está escrito pra que sejam os melhores.
beijo